7 de outubro de 2007

Isaac Newton e as revendas de TI

por Dagoberto Hajjar* e Roberto Mayer*

Com certeza você se lembra das aulas de física que falavam sobre Isaac Newton e de suas leis, que governaram nosso mundo de maneira absoluta por quase três séculos. Einstein formulou sua teoria adaptando essas leis para o macro-cosmo, e a física quântica para o micro-cosmo. Até hoje os cientistas buscam uma teoria que permita unificar as leis de Newton, Einstein e a física quântica.

Mas, o que isso tem a ver com o canal de vendas e distribuição de TI? Tudo a ver, porque o mercado brasileiro é um mercado altamente polarizado, ao mesmo tempo em que a maioria dos especialistas e consultores tenta estabelecer tendências baseando-se em médias de mercado.

Segundo a FGV, se compararmos a renda per capita do Brasil com a de outros países, não podemos considerar o Brasil um país pobre: a comparação internacional quanto à renda per capita coloca o Brasil entre o terço mais rico dos países do mundo. No entanto, temos 50 milhões de pessoas abaixo da linha de pobreza! Portanto, a renda per capita (que é a MÉDIA) não serve para planejar o desenvolvimento do país.

As vendas

O mesmo se aplica para as revendas de produtos e serviços de TI. Temos 20.000 revendas no Brasil, para um mercado com faturamento total de USD 10.6 Bilhões. Ou seja, o faturamento médio por agente de vendas é de cerca de um milhão de reais ao ano. Contudo, as 500 maiores empresas são responsáveis por quase 90% do total de faturamento brasileiro. Uma conta simples indica então que as demais revendas têm um faturamento anual abaixo de R$ 150 mil.

Uma pesquisa recente, desenvolvida pela MBI com quase duzentos pequenos integradores, resultou num faturamento médio de R$ 144 mil/ano.
Observe no gráfico que apenas 10,7% das revendas possuem faturamento anual igual ou superior a meio milhão de reais. Contudo, reina o otimismo quanto aos resultados a serem atingidos em 2006: a grande maioria das revendas projeta um crescimento na faixa de 10 a 25%, em comparação com o faturamento alcançado em 2005:

Analisando o negócio destas revendas, verifica-se que dois terços de suas receitas é oriunda da venda de produtos. Do terço restante da receita, resultantes de serviços prestados a seus clientes, metade resulta do conserto e upgrades em equipamentos de clientes. O restante da receita (um sexto do total) é obtido com serviços se origina em instalações de redes e cabeamento, configuração de infra-estrutura e serviços relacionados a segurança da informação.


A análise das formas de contato com os clientes revela que apenas metade das revendas desenvolve um trabalho pró-ativo com seus clientes atuais, visando gerar novas vendas. Tanto newsletters, quanto anúncios em jornais e lojas virtuais são aplicados, cada um, por cerca de um terço das revendas.
Entretanto, a proporção de negócios gerados por indicação de amigos ou outros clientes é de 40%. Mais, outros 42% das vendas foram feitas para clientes com mais de três anos de relacionamento. Sim, em média!

Quando analisamos os mesmos dados diferenciando as revendas maiores (consideramos nesta análise aquelas com faturamento superior a 250 mil reais ao ano) das menores, temos a primeira evidência nas diferenças de comportamento:

Observe como a proporção de revendas maiores que contactam os clientes de forma pró-ativa ou possuem loja virtual é muito maior. E são somente elas que participam de licitações governamentais!

Os negócios gerados com base em indicações são 43% para as revendas menores, mas apenas 36% para as maiores (ou seja, são bem menos dependentes desta forma de divulgação). Já as vendas para clientes com mais de três anos de relacionamento representam 39% do total para as empresas menores, e 44% para as maiores, indicando que estas são ligeiramente mais capazes de fidelizar os clientes.

Ao questionar sobre a principal razão para a fidelidade dos clientes, 69% das revendas afirmam que ela é conseqüência do atendimento e serviço que prestam a seus clientes, enquanto o restante considera que a fidelidade é conseqüência da qualidade dos produtos.


Entretanto, o percentual de empresas que acreditam no próprio atendimento como diferencial na fidelização dos clientes, é maior nas revendas maiores. Em outras palavras, elas se consideram menos dependentes das marcas que comercializam.

Outro aspecto avaliado, dentre as características do processo de vendas, foi a capacidade das revendas em vender produtos além daqueles solicitados inicialmente pelo cliente.

Neste aspecto, chama a atenção o fato que existem várias revendas pequenas e nenhuma maior que informou não conseguir vendas adicionais em nenhum caso. Por outro lado, das revendas que conseguem estas vendas complementares em mais da metade dos casos, o número de revendas pequenas é praticamente o dobro das grandes: entendemos que o atendimento personalizado que pode ser prestado pelos proprietários das pequenas revendas leva a este resultado.

Entretanto, nas duas faixas intermediárias, são as revendas maiores que levam vantagem significativa na quantidade de vendas complementares que conseguem efetivar.


Um outro aspecto importante avaliado é a capacidade de atender aos pedidos dos clientes com estoque próprio. Neste caso, a proporção de revendas maiores que opera com estoques próprios é menor do que a de revendas menores.

Entendemos que a manutenção de estoques próprios representa uma despesa financeira elevada. É ela que leva as revendas maiores a operacionalizar processos de logística com seus fornecedores, evitando a formação de estoques. Já as revendas menores têm menos consciência deste problema e menos capacidade de negociação com os fornecedores, porque trabalham com volumes menores.

Finalmente, dentre as questões relacionadas ao processo de vendas, selecionamos a questão pertinente ao número de fornecedores utilizados para a compra dos componentes de hardware usados para entregar os pedidos aos clientes: 82% das revendas compram componentes de quatro ou mais fornecedores diferentes. Ou seja, o grau de fidelidade para com os distribuidores é muito pequeno (cartão amarelo para eles!).

Ainda assim, existe uma clara tendência das revendas maiores a trabalhar com um número menor de fornecedores, mostrando mais uma vez a diferenciação no comportamento.

Marcas mais vendidas

Uma análise do mercado de revendas não seria completa sem a investigação das marcas preferidas pelas revendas.


No caso das CPUs, 94% das revendas trabalham com produtos Intel, enquanto 52% delas trabalham com produtos da AMD. Apenas 6% das revendas maiores estão focadas na venda de apenas uma das duas marcas.



Em relação a PCs e notebooks, HP e Toshiba são as marcas mais populares junto às revendas, seguidas pela Lenovo. A Sony é a única marca com participação maior (embora por margem muito estreita) nas revendas maiores do que as menores. Em outras palavras, as revendas menores oferecem uma variedade muito maior de marcas a seus clientes!

Surpreendentemente, a situação se inverte no caso das impressoras: as revendas maiores oferecem mais opções de marca que as menores. A HP mantém uma liderança inquestionável neste mercado, deixando um confortável segundo lugar para a Epson.


Já no caso dos monitores, LG e Samsung, além de disputar a liderança, se alternam na comparação entre as revendas maiores e as menores. A Philips ocupa o terceiro lugar, enquanto AOC e Sony formam um segundo 'pelotão'.

Para os equipamentos de rede, o primeiro ponto a ser observado é a escala do gráfico. Enquanto nas categorias anteriores a escala ultrapassava 80% sistematicamente, o maior índice neste segmento de mercado chega a 65%. Chama a atenção também o número significativo de revendas que afirmam não trabalhar com esta categoria de produtos.

A primazia do segmento de equipamentos de rede é disputada pela DLink e a 3Com. Ambas tem participação ligeiramente maior nas revendas maiores do que nas menores, mas a diferença é maior no caso da 3Com. O segundo 'pelotão' é formado por Cisco e Linksys (que possuem participação várias vezes maior nas revendas menores do que nas menores). Encore, Juniper e Huawei, são as principais marcas entre todas as demais citadas.


Em relação ao software, a liderança da Microsoft continua sendo inquestionável, com participação equivalente a seis vezes a do segundo colocado (Symantec). Entretanto, é a única marca de software a acompanhar a performance da Oracle na comparação das revendas maiores com as menores. Todas as demais marcas têm participação maior nas revendas menores, enquanto Microsoft e Oracle são mais fortes entre as revendas maiores do que nas menores.

Finalmente, questionadas a respeito de outras marcas comercializadas, que não se encaixam, nas categorias acima, foram citadas, com participação entre 10 e 20%, a Clone, APC, Asus, Seagate e Maxtor. Nenhuma destas marcas apresenta diferenças significativas na sua participação nas revendas menores em comparação à alcançada junto às maiores.

Conclusão

Muitos fornecedores e distribuidores não conseguem entender a realidade das revendas e ditam uma regra única para todos os tamanhos e perfis de parceiros. Pior do que isto são as empresas de treinamento e consultoria que querem aplicar as teorias de gestão, marketing e vendas que foram criadas para empresas como McDonald’s e Coca-Cola em empresas menores, como as revendas e ISVs brasileiros. Talvez neste momento você já tenha entendido porque está com tanta dificuldade em implementar as sugestões dos grandes fornecedores do mercado.

As teorias de gestão, marketing e vendas, tanto como as leis de Newton, devem ser adaptadas e repensadas para revendas e ISVs, levando em consideração a polarização e as particularidades do mercado brasileiro.


(*) Dagoberto Hajjar (dago@advancemarketing.com.br) trabalhou 10 anos no Citibank em diversas funções de tecnologia e de negócios, 2 anos no Banco ABN-AMRO, e, 9 anos na Microsoft exercendo, entre outros, as atividades de Diretor de Internet, Diretor de Marketing, e Diretor de Estratégia. Atualmente, é Diretor Presidente da Advance Marketing – empresa especializada em treinamento e consultoria de gestão, marketing e vendas para empresas de TI, e, com escritórios em Miami, São Francisco, México e Buenos Aires.

(*) Roberto Carlos Mayer (rocmayer@mbi.com.br) é diretor da MBI - Mayer & Bunge Informática Ltda, empresa especializada em pesquisa de mercado em Tecnologia da Informação (http://www.mbi.com.br) desde 1990, com atuação em toda América Latina, e diretor-secretário da Assespro São Paulo. Ex-professor do Departamento de Ciência da Computação da Universidade de São Paulo e do MBA da FIA.

publicado em julho de 2006

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